soulmate,

Who doesn't long for someone to hold
Who knows how to love you without being told
Somebody tell me why I'm on my own
If there's a soulmate for everyone


Quero amor. Não um qualquer amor vulgar, não. Quero um amor como nunca houve em peça ou filme algum. Quero um amor digno de recordar por várias e diversas gerações. Quero um amor que queime com um simples toque, que desperte as minhas borboletas adormecidas interiores e me faça tremer de emoção. Ai, pensamentos idiotas de uma romântica incurável, demasiado presa aos contos dos livros e, por conseguinte, demasiado desiludida com a frieza da vida. Tento focar-me em algo concreto para me afastar da falsidade dessa coisinha bonita a que chamam amor - essa tal que já nem sei se, de facto, existe. Dou por mim a fitar um gesto mecânico de um estranho, do outro lado da sala. Observo a forma como o cigarro se encaixa na sua mão, o leve movimento que faz quando o leva à boca, o contorno dos lábios enquanto o puxa para, depois, expulsar o fumo, largando as cinzas com um toque. Por alguma razão que desconheço este ciclo prende-me, logo a mim, que sempre abominei e repeli esse vício do tabaco. No entanto, acho a expressão de desinteresse deste indivíduo profundamente atraente e os seus olhos, algo frios e distantes, chamam-me. Mordo o lábio num gesto involuntário e inspiro a neblina, provocada pelo mesmo, e que chega, indistinta até mim. Esta minha reacção não lhe passa despercebida, demonstrando que não está tão alheio a tudo como quer transparecer. Levo o copo à boca e esvazio o seu conteúdo, o álcool unindo-se ao meu corpo. Do outro lado, o cigarro liberta-se mais uma vez, das já gastas cinzas. Este gesto tornou-se agora tão constante como o tiquetaque do relógio, quase como se o centro do universo se tivesse, por instantes, concentrado dentro daquelas paredes nuas. O meu telefone toca subitamente, lembrando-me que existe algo mais que este momento e estes joguinhos de sedução que por algum motivo tanto me cativam. É sinal de que me devo ir embora e deixar-te. Deixar-te? Desde quando trato por tu - ainda que apenas em pensamentos - personagens estranhas com os quais não troquei mais que meros olhares? E por falar em olhares, o teu perde agora a frieza inicial, como que se apercebesse do que se passa e pedindo-me que não vá. As minhas pernas falham por segundos e não sou capaz de qualquer movimento. Descansa, está tudo bem. Compra mais um maço de vício, fuma-me mais um pouco.
Sinto-me um nada. Estarei, por fim, a sucumbir à insanidade? Pergunto-me se algo do que digo fará algum sentido, se merecerei ou não ser ouvida, se esta minha existência será nula. Olho para a folha rabiscada à minha frente. Não me faltam os sentimentos mas sim as palavras. Não existe pedaço de papel em que caiba tamanha angústia. Não há conceito que suporte tal dor. Nunca algo será capaz de albergar a fragmentação em que me encontro. Desisto, amachucando esta tentativa inútil de desabafo e atirando-a para longe, ouvindo-a depois a percorrer o chão até embater em algo. O som da casa agora que não estás arrepia-me e dá-me medo. O frio tornou-se um companheiro constante. Os meus suspiros ecoam nas paredes vazias. Às vezes, julgo ouvir os teus passos nos corredores. Mas são apenas os fantasmas das recordações - a minha mente pregando-me uma partida - para que não me sinta tão sozinha. Isto, que antes era um lar, o nosso porto de abrigo e o nosso refúgio secreto, tornou-se agora apenas um amontoado de tijolos, pedras que não significam coisa alguma. Eu já não significo coisa alguma. Como pude entregar-me assim a um estranho? Porque é que lhe dei tantos anos da minha vida, apagando parte de mim, em troca de um sentimento tão tosco como o amor? Tenho ganas de mim mesma. A imagem que o espelho me devolve dá-me náuseas. Quero pegar neste sentimento que me inunda e arrancá-lo de mim. Cuspir esta paixão. Vomitar até não sentir mais. Nada. Desejo esvaziar-me de ti e de nós, ainda que, ao fazê-lo, esteja a extrair de mim a única beleza que ainda resiste neste meu rosto pálido e cansado. Sinto-me um fantasma do passado. Uma sombra ténue e fraca do que fui outrora. É como se tivesse posto a minha vida em piloto automático. Já nada é sentido. Chego ao fim de horas sem me lembrar do que fiz, se é que fiz algo. Abandono o meu corpo e perco-me em mim mesma por períodos indeterminados. Entrei num estado de profunda apatia. Nada significa nada. Nada é nada. Desliguei-me, pura e simplesmente. Nem sei se é normal que enquanto tudo me grita
- Esquece-o ,
ele se vá apoderando cada vez mais do meu incauto coração. Por vezes, penso que isto não passa de mais uma paixão adolescente, uma espécie de amor de verão travesso que se deixou ficar um pouco mais, um daqueles romances que nos prendem a respiração de tão reais e vívidos que parecem. Repito, parecem. Simples mistérios de faz-de-conta. Parvoíces sem noção às quais jurei nunca me entregar. E agora dou por mim dentro de uma - a viver uma - que me consome as entranhas e me faz indagar, a quem me conseguir responder, se existirá vida depois dele. Se existirá vida depois de ti, meu amor. Se será possível viver sem ti, o homem que me fez feliz sem sequer saber. Se conseguirei não sucumbir sabendo que não tornarás a esta casa. Se serei capaz de voltar a ter em mim algo que se assemelhe a uma vida, quando o meu futuro se foi embora quando partiste. E todas as promessas como
- É contigo que vou casar,
e as juras como
- Nunca te irei deixar,
desvaneceram-se como a neblina do tabaco que fumavas da primeira vez que te vi. Eu era a Special One, lembras-te? Sei-o e sei-o tão bem que dói cá dentro. Hoje, desperto e não te vejo. Já não aqueces os lençóis nem tão pouco o meu coração. O leito que era nosso tornou-se apenas e insuportavelmente meu. Na realidade, amei o homem mais distante de mim que foi possível conceber, e nessa distância o mais próximo, se o mais próximo é o que sonhamos e não aquilo que estamos destinados a ter. Perguntei-te, já quando os dias eram mais cinzentos
- Isto é o fim?
ao que não me soubeste dar resposta. Eu não me preocupei, devia lidar com o horror quando e se se tornasse real, não havia porquê torturar-me com hipóteses obscuras. Nós íamos deixar para trás aquela ervilha que nos incomodava, no fundo dos infinitos colchões e colchas. Afinal, era isso que fazíamos, certo? Sobreviver. A todas as tempestades e trovões das brigas e discussões. A todas as palavras feias e cruéis, criadas para ferir, que desapareciam com um sincero pedido de desculpas e um beijo urgente. Até ao dia em que te foste embora, deixando a tempestade e as palavras feias pendentes no ar - incapazes de desaparecer por si só - e uma porta aberta, que eu não tive nunca coragem de fechar.