saudade,

Sinto o calor da tua respiração que me faz cócegas no rosto enquanto te abraço com força. Custa-me pensar em despedidas, partidas, adeus. Ouço o teu coração, encostada ao teu peito e tento conter a saudade que se antecipa e me tenta fugir pelos olhos. Apetece-me pedir-te, gritar-te que não vás.
Parece que estou desligada do resto do mundo. Consigo ver embora apenas distinga figuras. Consigo ouvir mas baixo, como se as palavras fossem apenas um murmúrio de fundo por trás de um diálogo principal num filme. Um diálogo que não existe. Não tenho bem consciência de onde estou ou mesmo de quem sou. Perdi a noção de há quanto tempo é que estou para aqui, sentada neste banco e fitando o vazio enquanto uma voz distante e fria parece repetir sempre o mesmo. Última chamada para o voo 597, última chamada para o voo 597. Não sei se se passaram segundos, minutos ou horas. Sinto que passou muito mais, sinto que desapareci no momento em que partiste. Afinal, como poderia eu alguma vez existir sem ser ao teu lado? Existir sem ti, que ideia absurda. Os aeroportos sempre me fascinaram, costumava resumi-los numa palavra: cheios. São lugares tão mágicos, tão carregados de emoções. Tantas despedidas e tantos reencontros. Tantas lágrimas de tristeza, de felicidade, de saudade. Mas neste momento, estranhamente, parecem-me vazios. Tudo me parece vazio e desejo ardentemente que este tudo não passe de um sonho, um sonho muito mau. Desejo acordar e descobrir que felizmente continuas deitado ao meu lado, quero olhar-te enquanto dormes nesse teu sono profundo até que acordes por fim para me encontrares a sorrir sem qualquer explicação. Julgas-me louca e sorris-me também. Não fazes ideia da quantidade de loucura que está por detrás do meu rosto sereno. Não nesses momentos mas agora, agora que te foste. Sabes que não tinhas o direito de mudar assim a minha rotina, a minha alegre monotonia. Não tinhas o direito de partir. Mas partiste após um leve beijo triste e não sei quando vais voltar.
Sinto que me falta um bocado. Quem me dera que estivesses ao meu lado.

os meus,

A relva faz-me cócegas e provoca em mim pequenos sorrisos ocasionais. Aqui, debaixo deste salgueiro, observo o céu azul e as nuvens que vão e vem, vem e vão. Não ouço nada senão o vento a dançar por entre as folhas ao som de uma música que me tem enchido a cabeça. Tenho andado tão exausta e atarefada que saboreio com felicidade este pequeno momento a sós comigo e com os meus pensamentos. Acabo por me lembrar daquilo que mais dor me causa, o passado. Não, não é bem assim, o que me atormenta não é bem o passado, mas sim o presente. Não é o ontem, é o hoje. E talvez também o amanhã. Talvez. Arranco as pétalas de uma qualquer flor que veio de encontro a mim. Mal-me-quer, bem-me-quer, mal-me-quer. Frustrada, atiro a inocente margarida para longe de mim, para algum lugar em que não a possa ver. Longe da vista, longe do coração. E quem me dera conseguir atirar também estas saudades para bem longe daqui, para longe de mim. Parece que as palavras sempre e eternamente perderam o sentido algures no tempo e eu sinceramente continuo sem saber como é que alguém se consegue esquecer de outro alguém assim. De um dia para o outro, da noite para o dia. Não sei como nem quero saber o porquê. Tenho vontade de vos abanar até que a vossa cabeça - não, a cabeça não - até que o vosso coração volte ao lugar certo. Apetece-me gritar aos céus que vocês eram meus. Toda a gente dizia que talvez nunca mais estivéssemos juntos, mas que, de certa forma, nunca mais estaríamos separados. Mentira, mentira, mentira. Eu só queria voltar a ter tudo o que outrora tive, só vos queria a todos de novo ao meu lado. Não queria perder mais ninguém. Já não sei se sou capaz de perder mais uma conversa, mais um abraço, mais um beijo na testa. Não sei se consigo aguentar a perda de mais um sorriso, a perda de mais um amigo. E é assim que, aqui, debaixo deste salgueiro, ao som do vento e dos pensamentos, observo o céu agora cinzento e as nuvens que vão e vem, vem e vão.