deixa-me quieta,

Não me contes o fim, não o quero saber. Deixa-me quieta com os meus pensamentos. Deixa-me quieta comigo. Deixa-me. Não quero mais abraços nem beijos na testa nem sussurros preocupados. Eu estou bem. Porque é que não havia de estar? Eu estou bem, eu vou ficar bem. Já aceitei, já me mentalizei, já passei a fase da ressaca. Estou no fim da fase de adaptação e uma vez essa concluída acabou. Não me contes o fim. Não me digas que ainda não é certo, que as coisas mudam, que pode ainda haver uma volta de trezentos e sessenta graus. Desculpa-me, mas uma volta de trezentos graus já aconteceu. A volta de trezentos e sessenta graus aconteceu quando me sentei naqueles degraus gelados e senti o travo amargo de um ponto final. Não me façam crer em príncipes encantados nem em cavalos alados. A decisão nem foi minha, o fim nem veio de mim. Deixem-me, deixem-me quieta comigo. Não me tentem impingir palavras todas queridas, elas não apagam nada, elas não mudam nada. Deixem-me. Não fiz mal a ninguém. Acho que não fiz mal a ninguém. Se fiz não foi por mal, se fiz não foi por querer. Nunca quis nada. Nunca quis ninguém. Mentira, quis-te. Mas acabou, tu ditas-te o fim do capítulo, do livro, o epitáfio. Não me posso permitir pensar em ti. Deixa-me quieta. Não me venhas dizer que não passa de uma confusão passageira, não me tentem convencer que devo esperar. Não espero, desculpem-me mas não espero. Esperei demais, espero sempre demais. Não espero mais. Não, não vou esperar. Chamem-me o que quiserem... Acho que tenho o direito de tomar as rédeas da minha vida. Posso não ter jeito nenhum para tal mas pelo menos não poderei culpar mais ninguém senão eu pelos erros cometidos. Não vou imaginar finais todos felizes antes de adormecer. Podia perder-me em memórias e recordações e pensar que ainda havia esperança, que ainda podias cair em ti. Mas não vou, não quero. Não quero sempres. Queria um agora e o agora foi-me tirado. Não quero mais coisa alguma. Quero paz e silêncio e não pensar em ti. Deixa-me quieta e não me contes o fim. Não o quero saber.

(é só mais um fim, é só mais um começo)

ficam as saudades,

Não quero ir dormir... Oh, por favor, deixem-me ficar acordada mais um pouco. Não quero ficar sozinha com a minha cama vazia, com o escuro, com os sonhos que aí vem, com esta dor estúpida. Também me sinto um bocadinho estúpida, sabes? Só um bocadinho... Por ter acreditado que gostavas mesmo de mim. Por pensar que tinha encontrado o 'tal' final feliz. Um bocadinho estúpida, diga-se de passagem. Hoje, naqueles degraus frios, não te reconheci. Não sabia, não sei, quem era aquela sombra ao meu lado, explicando-me - da mesma forma que se explica a uma criança que quem anda à chuva se molha (aliás, fica encharcado!) - que há coisas que não estão destinadas a ser. E eu iludida, e eu a pensar que sim, que podiam ser. Pateta, Inês pateta. Como se não fosse óbvio que quem anda à chuva se molha (aliás, fica encharcado!). Como se não fosse óbvio que quando entregamos o coração a alguém podem dar cabo dele. E deram. Bolas. Engraçado, engraçado que é quando decido guardar os pontos finais que o outro lado decide dar-lhes uso. Isn't it ironic? De qualquer forma nunca fez sentido teres sequer olhado para mim. Se bem que 'nem eu sou bom de mais para ti nem tu és boa de mais para mim, somos perfeitos um para o outro'. Balelas. Enfim, agora é embrulhar tudo e guardar na gaveta, bem escondidinho, lá mesmo no fundo, e fingir que nada se passou. E vamos ser fortes, e vamos ser meninas grandes ('cause big girls don't cry), e não vamos ver filmes lamechas, e não vamos ouvir música, e não vamos pensar muito e tudo voltará a ser o que era. O tempo tanto pode ser o nosso pior como o nosso melhor amigo. Desta vez vou-me aliar a ele. E esperar. Afinal de contas, já sou uma rapariga crescida... Até já sei atar as sapatilhas sozinha. Não vejo razão para não conseguir pegar nesta coisinha pequenina (à qual já mal se pode chamar coração) e pô-la no bolso do casaco, de forma a não sentir o tum-tum suave. Cala-te, direi algumas vezes, quando bater com mais força. E pronto, já está.


(descansa, não te guardo qualquer rancor, a parva aqui sempre fui eu)